terça-feira, 24 de julho de 2018

Colaborações entre artistas plásticos e a indústria cerâmica da SECLA

Produto próprio

Colaborações entre artistas plásticos e a indústria cerâmica da SECLA


A presente exposição incide sobre as colaborações entre artistas e indústria cerâmica ensaiadas nas décadas de 1950 e 1960 nas Caldas da Rainha. Os exemplos apresentados reportam-se à SECLA, uma fábrica de faiança que esteve activa entre 1945 e 2008. Escolheu-se uma amostra representativa, mas não exaustiva, dos autores envolvidos nessas colaborações dos trabalhos delas resultantes.                          
SECLA é a abreviatura de Sociedade de Exportação e Cerâmica Limitada. A empresa sucedeu em 1947 à Fábrica Mestre Francisco Elias, criada dois anos antes. Vocacionada para a exportação, a SECLA deu prioridade à inovação, tanto nos processos técnicos, como nos modelos de louça e respectiva decoração. Afastou-se da tipologia de produtos correntes na faiança das Caldas de inspiração naturalista, respondendo aos novos gostos dos consumidores europeus e americanos e introduzindo o conceito de design na sua produção.
Nos primeiros tempos da SECLA, a direcção técnica e artística foi exercida por Alberto Pinto Ribeiro, fundador da empresa. A partir de 1954, essa função foi desempenhada por Hansi Staël, uma pintora de origem húngara. Entre 1959 e 1964, essa responsabilidade foi atribuída ao escultor José Aurélio. Sob a égide de todos eles, diversos artistas portugueses foram acolhidos na SECLA para realizarem experiências em cerâmica. Também procuraram a fábrica, neste período, jovens estrangeiros que pretendiam fazer estágios de aprendizagem em fábricas de cerâmica após a conclusão dos seus cursos artísticos.

Motivações distintas impulsionavam os trabalhos destes artistas, desde os que pretendiam exercitar a pintura e a decoração em produtos cerâmicos, aos que procuravam na plasticidade da pasta resposta aos seus projectos na escultura. Outros ainda era o design que os tentava. Destas experiências poderiam resultar peças únicas, peças susceptíveis de serem editadas em pequenas séries, e, até, modelos que entrassem na produção industrial.
Para a empresa, a esta presença de artistas ficava associado um factor de prestígio. Era uma prática corrente nas fábricas que pretendiam ter a preferência entre o gosto moderno dos consumidores. Algumas das peças acabariam por ser vendidas, embora o aspecto da rentabilidade do investimento não fosse aqui dominante. Acreditava-se, por outro lado, que, na hipótese de algumas das propostas artísticas serem adaptáveis à fabricação em série, este pudesse ser o caminho para vir a ter um produto próprio que individualizasse o seu catálogo em relação ao dos concorrentes.
A esta prática na SECLA deu-se o nome de Estúdio. O Estúdio não era propriamente um espaço dedicado, mas uma condição de acesso dos artistas em trabalho temporário aos saberes, equipamentos e apoios técnicos especializados na fábrica. Entre estes apoios, o mais importante foi o recurso ao saber de um oleiro rodista, natural de Barcelos, Picas do Valle.
Este conceito de Estúdio era tão amplo que nele couberam os próprios administradores da Secla, Alberto Pinto Ribeiro e Fernando da Ponte e Sousa, bem como os artistas contratados pela fábrica, os já referidos consultores Hansi Staël e José Aurélio, ou Ferreira da Silva e Herculano Elias. O Estúdio era afinal um laboratório criativo da Secla, funcionando em paralelo com o circuito fabril, mas mantendo com ele articulações permanentes.

João B. Serra


Esta exposição foi concebida e organizada no âmbito da unidade curricular Oficina de Mediação Cultural II, da licenciatura em Programação e Produção Cultural, orientada pela Prof.ª Lígia Afonso. Insere-se no Projecto de investigação “CP2S Cerâmica, património e produto sustentável – do ensino à indústria” (CENTRO-01-0145-FEDER-23517).