terça-feira, 29 de agosto de 2017

O Mural de André Saraiva (Lisboa, 2016)


















André Saraiva
[Texto de apresentação da Exposição que o MUDE DESIGN organizou em 2014 do artista]
Artista de origem portuguesa, iniciou a sua carreira nos anos 1980, nas ruas de Paris, quando começou a pintar os seus graffiti nas paredes da cidade. No início dos anos 1990, Saraiva criou um "alter-ego", Mr. A - uma personagem alegre, enérgica e longilínea, de cabeça redonda e grande sorriso, que começou a invadir montras, estações de metro, caixas de correio e edifícios devolutos das cidades euro­peias. À medida que as viagens de Mr. A atingiram uma escala mundial, ocorreram mudan­ças subtis na aparência e na indumentária - uma cartola, olhos em forma de X, asas e até a sua projeção no feminino - que deram profundidade à personagem de Saraiva. Nunca perdendo a sua linguagem gráfica de origem, André Saraiva tem vindo a explorar outros territórios artísticos, nomeadamente a instalação, a pintura, a serigrafia, a direção criativa da revista L’Officiel Hommes e, mais recentemente, edição, a curta-metragem e o vídeo.
Parafraseando Andy Warhol (Being good in business is the most fascinating kind of art. Making money is art and working in art and good business is the best art”), André Saraiva é na atualidade uma das figuras cimeiras do grafitti mundial e um artista global para quem a arte é um bem de consumo, entretenimento e prazer. Proprietário do night-club Le Baron, em Londres, Nova Iorque, Tóquio e Paris, e de Hotel Amour (Paris), tem colaborado com as principais marcas multinacionais, como por exemplo, Louis Vuitton, Levi’s, Moet & Chandon, Chloé, Chanel, Belvedere, Fendi, Cartier ou Givenchy, sendo um exemplo de como a linguagem marginal, irreverente e transgressora do graffiti foi sendo apropriada pelo sistema e pelas instituições. O resultado é um universo de objetos e produtos onde a sua linguagem irónica, descomprometida e sexual, por vezes subversiva, de cores vivas e contrastantes, faz a diferença. Isso não significa que tenha deixado as ruas, onde continua a deixar a sua marca através dos Love graffiti.
A sua obra tem vindo a ser reconhecida e exposta em vários museus e galerias de arte contemporânea com exposições a solo onde é possível ver segmentos do seu trabalho, como os Dream Concerts ou as arquiteturas da sua Andrépolis. Destaque para Palais Tokyo (Paris), Maison Kitsuné (Tóquio), Museum of Contemporary Art (Los Angeles), Circle Culture Gallery (Hamburgo), Anonymous Gallery (Cidade do México). No MUDE a exposição André Saraiva, com quase 200 peças, é pensada e desenhada como uma grande instalação no piso 3. As diferentes expressões artísticas em que tem trabalhado surgem em complementaridade, de modo a sublinhar o seu desenho e dando a conhecer a sua obra que aprofunda a linguagem pop e é devedora das noções de espectáculo, arte com um sentido lúdico e contaminação entre a arte erudita e a arte pop do pós-modernismo.
[Entrevista com André Saraiva realizada em 2014, a propósito da sua exposição no MUDE, por Frederico Bernardino]
O criador de Mr. A, referência mundial do graffiti, revisita 20 anos de atividade artística no Museu do Design e da Moda.
Artista, writer de graffiti, empresário… Uma vida em tons de rosa, com provocação e hedonismo q.b. O nome é André Saraiva, e é uma personalidade marcante da street art das últimas décadas, muito por culpa de Mr. A, figura estilizada de cabeça redonda, olhos em forma de X, sorriso rasgado e pernas lineares e compridas, que se propagou por fachadas, muros e montras de cidades de todo o mundo. “Mr. A é um alter-ego, mas é também o meu melhor amigo, a minha própria sombra”, sublinha-nos o artista enquanto bebe um café longo rodeado dos cartazes dos seus Dream Concerts, peças que ocupam parte do piso 3 do Museu do Design e da Moda (MUDE), onde se realiza a primeira exposição do artista a solo e em nome próprio.
“Não encaro esta exposição como uma retrospetiva do meu trabalho. Trata-se de trazer para o espaço de um museu aquilo que fiz ao longo de 20 anos”, esclarece. Aqui há pintura, instalação, arquitetura, filme, fotografias, objetos pessoais… mas o rasto do graffiti está plasmado em quase tudo – “porque, acredito, o graffiti é um modo de expressão da rua, não de um local fechado como uma galeria ou um museu, apesar de contaminar fortemente as minhas outras formas de expressão artística”.
Filho de portugueses, André nasceu na Suécia, tem nacionalidade francesa e começou a fazer graffiti “aos 12, 13 anos” nas noites “ilegais e arriscadas” de Paris, em meados da década de 1980. Como o seu português é pouco fluente, decide conduzir-nos pelos mais de mil metros quadrados da exposição em inglês. Afinal, confessa, “sou do mundo e de lado nenhum, não me sinto francês, nem português. Sou sempre um estrangeiro”. Por isso, entre os objetos pessoais expostos em vitrinas da autoria do Arquiteto Jorge Segurado, cedidas pelo Museu de Arte Popular, se encontre um exemplar de O Estrangeiro de Albert Camus, que o artista elege como um dos seus romances favoritos.
Porém, a obra de André deve pouco ou nada ao existencialismo. Tudo é assumida e conscientemente hedonista. A cor, com o rosa choque como preponderante em muitas das peças (as cabeças de Mr. A em 3D que se espalham pelo espaço o demonstram), sublinha o divertimento, o prazer, o divertimento e, de certo modo, todas as frivolidades da sociedade de consumo, espelhadas de modo provocativo no Rato Mickey com ereção, criação que valeu a André uma polémica com a Disney.
Penetrando no ambiente puramente pop que estrutura o universo do artista, destacam-se as dezenas de “concertos sonhados” para os quais concebeu cartazes que surgiram espalhados por várias cidades do mundo. São quase sempre encontros mais que improváveis, evocações de artistas da música, da arte ou da literatura, que admira e o inspiram. Os nomes de Keith Harring e Andy Warhol, David Bowie e Rolling Stones, Norman Mailer e Boris Vian inscrevem-se em noites únicas pelas melhores salas de espetáculo do mundo. “Há uns anos, o cartaz de um Dream Concert com os Daft Punk como cabeças de cartaz gerou enorme confusão em Nova Iorque porque houve muita gente a levá-lo a sério”, conta André que assume gostar de “intrigar as pessoas e estimular-lhes uma sensação de prazer com concertos que jamais poderiam existir”.
Um mundo de utopias urbanas, decerto complementadas nos bares em arranha-céus com neóns que se erguem na Andrépolis, instalações arquitetadas noutro núcleo da exposição. Extensões artísticas da vida de empresário – André é dono dos night clubs Le Baron em Nova Iorque, Tóquio, Londres e Paris –, os edifícios desta cidade brilham como se a vida fosse sempre cor-de-rosa. Ou, não fosse a obra de André Saraiva uma ilustração radiante da sociedade de consumo imediato de estímulos provocados pela imagem, pelo espetáculo e pelo grafismo. Seja in ou outdoor.
Um mural para a cidade
“Um desafio inédito na minha carreira”. É assim que André Saraiva define o convite feito pela Câmara Municipal de Lisboa e o Grupo Prebuild, proprietário da Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, para oferecer à cidade um mural de azulejos pintados à mão. Com o comprimento total de 106 metros e 950 metros quadrados de área, o painel será colocado, até meados de 2015, no muro do Jardim Boto Machado, junto à Feira da Ladra.
Na exposição é possível ver a maquete a preto e branco da obra. Para o artista, o mural representa “um sonho habitado por uma mistura imaginária de Lisboa com Paris, Nova Iorque, poesia e discotecas. Ou seja, vão coexistir referências bem portuguesas e outras muito cosmopolitas”.

O mural foi terminado em 2016. Está aplicado aos muros do Jardim Botto Machado em Lisboa, localizado junto à Feira da Ladra, no Campo de Santa Clara.
[Texto da apresentação do mural do Jardim Botto Machado]
Com uma área total de 1011.1 m2 e 188 metros de comprimento, o painel foi fabricado pela Fábrica de Cerâmica Viúva Lamego, seguindo técnicas e métodos de produção artesanais, e pintado à mão pelo artista também naquele espaço, resultando numa peça única composta por 52738 azulejos. 
O desenho de André Saraiva no mural propõe uma “reinterpretação” da cidade de Lisboa, representada através das cores e do desenho que caracterizam o trabalho do artista. Passado e presente misturam-se, tal como algumas referências a outras capitais mundiais onde o artista vive e trabalha. O céu e o Tejo são o pano de fundo, representados pelos tons branco e azul, distintivos da cidade de Lisboa. Reconhecem-se, entre outros marcos da cidade, o Castelo de S. Jorge, o Padrão dos Descobrimentos, a Ponte 25 de Abril, o Elevador de Sta. Justa ou a Praça de Touros do Campo Pequeno, juntamente com Mr. A, personagem que André Saraiva criou nos anos noventa e que rapidamente se espalhou pelas ruas de várias cidades europeias. 


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